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CARL ROGERS (4) – TERAPIA CENTRADA NO CLIENTE

Rogers entende que algumas condições são necessárias para que o sucesso da terapia possa ocorrer. Primeiramente, o terapeuta deve apresentar congruência, ou seja, autenticidade, deve ser ele mesmo. Segundo, ele deve ter uma postura de aceitação incondicional em relação ao cliente. Terceiro, precisa estar disposto a ouvi-lo com empatia, sem prejulgamentos.

Embora as três condições sejam necessárias, Rogers afirma que a congruência é a mais importante e básica para o processo terapêutico, pois congruência é uma qualidade geral pertencente ao terapeuta, ou seja, a congruência é uma disposição do terapeuta em relação a si mesmo, já a aceitação incondicional e a empatia são sentimentos e atitudes que o terapeuta terá por cada cliente em específico.

 

Congruência

congruA primeira condição necessária para o sucesso do processo terapêutico é que o profissional seja congruente. A congruência existe quando alguém está em contato com o eu organísmico, o eu real. Ser congruente significa ser verdadeiro, genuíno, inteiro; ser o que realmente é. O terapeuta congruente tem a habilidade e o desejo de expressar abertamente seus sentimentos.

Rogers percebeu muito cedo em sua prática terapêutica que, em longo prazo, não era útil fingir ser aquilo que ele não era. Um terapeuta congruente não é apenas uma pessoa boa e amigável, mas um ser humano completo que sente alegria, raiva, frustração, confusão etc. Quando esses sentimentos são vividos, não são negados nem distorcidos, mas reconhecidos e expressos. O profissional congruente, portanto, não é passivo, distante nem “não diretivo”.

Em algumas obras, a terapia centrada no cliente ainda é tratada como não diretiva, mas o fato é que a terapia movimenta-se em uma clara direção, a de garantir que o cliente entre em contato com seu eu organísmico para que a mudança terapêutica ocorra, e o terapeuta dirige o processe nesse sentido ao promover o clima psicológico necessário.

O profissional congruente não é estático. Como a maioria das outras pessoas, ele está constantemente exposto a novas experiências, mas ao contrário dessas pessoas, ele recebe tais experiências de maneira consciente, sem negá-las ou distorcê-las, o que contribui para o seu crescimento psicológico. Ele não usa máscaras, nem sustenta uma fachada falsamente agradável, e evita fingir afeição ou amizade quando esses sentimentos não são realmente sentidos. Da mesma forma, ele não finge raiva, dureza ou ignorância, nem encobre sentimentos de alegria, euforia ou felicidade. O terapeuta congruente é capaz de lidar com seus sentimentos de maneira consciente e expressá-los com honestidade.

Rogers afirma que o terapeuta será mais eficiente se ele comunicar sentimentos genuínos, mesmo que eles sejam negativos ou ameaçadores. Agir de outra maneira seria desonesto com os clientes, e eles o perceberiam, mesmo que de forma não consciente. De toda forma, Rogers entende que existem diferentes níveis de congruência, ou seja, o terapeuta não precisa ser absolutamente congruente para facilitar a mudança terapêutica do cliente. Não é necessário ser perfeito para que alguém seja um terapeuta eficiente.

 

Aceitação incondicional

aceSegundo Rogers, o terapeuta deve aceitar o cliente como é, sem possessividade, sem julgamentos e sem reservas. Aceitar sem possessividade significa importar-se com o outro sem sufocá-lo ou apropriar-se dele; significa importar-se e permitir que o outro seja autônomo e independente, entendendo-o como um indivíduo separado que tem direito aos próprios sentimentos e opiniões em relação ao que é certo e errado. O fato de importar-se com o cliente, não significa que cabe ao terapeuta guiá-lo em suas escolhas, mas que ele lhe permite ser como é e decidir o que considera melhor. Como vimos, esse tipo de atitude permissiva rendeu a Rogers o qualificativo de terapeuta passivo e não diretivo, mas na terapia centrada no cliente o terapeuta deve estar ativamente envolvido com o cliente.

A aceitação incondicional quer dizer que o terapeuta preza e aceita seus clientes sem restrições ou reservas quanto a seus comportamentos. Embora o terapeuta possa valorizar mais alguns clientes do que outros, sua aceitação incondicional permanece constante e inabalável. A aceitação incondicional também indica que o terapeuta não julga seus clientes, nem aceita uma ação e rejeita outra. As avaliações externas (das outras pessoas), sejam positivas ou negativas, levam os clientes a comportamentos defensivos e atrapalham seu crescimento psicológico.

 

Empatia

empaA terceira condição necessária para a promoção da mudança terapêutica é a empatia. Empatia existe quando o terapeuta sente de maneira precisa os sentimentos de seus clientes, e é capaz de comunicar essa compreensão de maneira que eles saibam que outra pessoa foi capaz de entrar em seus mundos sem preconceitos, projeções ou julgamentos. Para Rogers, empatia significa viver temporariamente a vida de outra pessoa, movimentando-se nela com delicadeza, sem fazer julgamentos. A empatia não envolve interpretar os significados dos clientes ou descobrir seus sentimentos inconscientes, esses procedimentos implicariam em um ponto de referência externo e ameaçariam os clientes. Ao contrário, a empatia sugere que o terapeuta vê as coisas do ponto de vista do cliente, que se sente seguro e não ameaçado.

Terapeutas centrados no cliente não supõem que a empatia ocorra naturalmente, eles verificam a adequação de suas percepções consultando os próprios clientes: “Percebo que você está sentindo ‘X’ em relação à determinada pessoa ou situação, estou correto?” A validação do entendimento empático é normalmente seguida por uma resposta do cliente confirmando a percepção do terapeuta ou a retificando.

A empatia é uma poderosa ferramenta que, junto com a congruência e a aceitação, facilita o crescimento pessoal do cliente. Na visão de Rogers, quando uma pessoa se sente compreendida adequadamente, ela se sente em maior contato com suas próprias experiências. Isso lhe dá uma referência ampliada à qual recorrer em busca de autocompreensão e auto-orientação. Se a empatia do terapeuta for precisa e profunda, o cliente pode se tornar capaz de desbloquear o fluxo de certas experiências e permitir que elas sigam seu curso sem inibições. A empatia é eficiente porque ela permite ao cliente ouvir a si mesmo e, em consequência, tornar-se seu próprio terapeuta.

É importante não confundir empatia com simpatia. A simpatia sugere um sentimento “pelo” cliente, enquanto a empatia indica um sentimento “com” o cliente. A simpatia nunca é terapêutica, pois ela está baseada em avaliações externas e normalmente leva o cliente a sentir pena de si mesmo; a autopiedade é uma atitude deletéria que ameaça um autoconceito positivo e cria desequilíbrio na estrutura do self.

Deve-se notar, entretanto, que ter empatia não significa que o terapeuta tem os mesmos sentimentos do cliente. O terapeuta não sente raiva, alegria, ressentimento, frustração ou excitação quando o cliente vive esses sentimentos. Em vez disso, o terapeuta sente a profundidade dos sentimentos do cliente ao mesmo tempo que lhe permite ser um indivíduo separado. O terapeuta tem uma reação cognitiva e emocional em relação aos sentimentos dos clientes, mas esses sentimentos pertencem aos clientes, não ao terapeuta. Um terapeuta não se apropria das experiências do cliente, mas é capaz de oferecer-lhe um espaço no qual possa amadurecer um entendimento sobre os significados dessas experiências.

 

Estágios da mudança terapêutica

Rogers identificou que cada cliente é único, mas que, em linhas gerais, todos passam por um processo ao longo da terapia que pode ser esquematizado em sete estágios. Dessa forma, a atividade construtiva da mudança na personalidade pode ser colocada em um contínuo que vai das atitudes mais defensivas às mais integradas.

Estágio 1: Caracterizado pela ausência de disposição para comunicar qualquer coisa sobre si mesmo. Nesse estágio, a pessoa normalmente não busca ajuda, mas se por algum motivo ela vai à terapia, mostra-se extremamente rígida e resistente à mudança. Ela não reconhece qualquer problema e se recusa a comunicar quaisquer sentimentos ou emoções pessoais.

Estágio 2: O cliente se torna levemente menos rígido. Discute eventos externos e fala sobre outras pessoas, mas ainda recusa ou tem dificuldade em reconhecer os próprios sentimentos. Contudo, pode falar sobre sentimentos pessoais como se fossem fenômenos objetivos.

Estágio 3: Nesse estágio, o cliente fala mais livremente sobre si, mas ainda de forma objetiva, ou seja, sem nuances, tudo parece exato, preto no branco. Por exemplo, ao enfrentar um problema no trabalho ele pode dizer que dá o melhor de si, mas que seu chefe ainda não gosta dele. O cliente fala de sentimentos e emoções no passado ou no futuro, mas evita os sentimentos presentes. Recusa-se a aceitar as próprias emoções, mantém sentimentos pessoais à distancia do aqui e agora, percebe apenas vagamente que pode fazer escolhas pessoais e nega responsabilidades individuais em relação à maior parte de suas decisões.

Estágio 4: O cliente começa a falar sobre sentimentos profundos, mas na maioria das vezes não fala sobre aqueles que são sentidos no momento, e quando os sentimentos presentes surgem em seu relato, o cliente se surpreende por expressá-los. Ele nega ou distorce experiências, embora tenha uma vaga percepção de que é capaz de sentir emoções no presente. O cliente começa a questionar certos valores que foram introjetados a partir das opiniões de terceiros e começa a ver a incongruência entre o autoconceito (o eu percebido) e o eu organísmico (o eu real). Já é capaz de aceitar mais liberdade e responsabilidade do que no estágio anterior, e começa a se permitir um maior envolvimento com o terapeuta.

Estágio 5: Ao chegar nesse estágio, o cliente começou a experimentar mudanças significativas e crescimento. Ele consegue expressar sentimentos no presente, embora ainda possa haver algum nível de distorção das experiências que provocam esses sentimentos, e dos sentimentos em si. O cliente começa a confiar em seu processo de avaliação organísmico, sua bússola interna, fazendo novas descobertas sobre si mesmo. Ele também experimenta uma maior diferenciação entre seus sentimentos e passa a apreciar as nuances que os diferenciam. Adicionalmente, o cliente começa a tomar suas próprias decisões e a aceitar responsabilidades por suas escolhas.

Estágio 6: O cliente chega a esse estágio experimentando um crescimento profundo e um movimento irreversível no sentido de se tornar um pessoa completamente funcional (já estudamos esse conceito em tópicos anteriores nesse material), também conhecida como pessoa autoatualizadora ou autorrealizadora. Ele aceita em sua consciência experiências que anteriormente negava ou distorcia, torna-se mais congruente e é capaz de reconhecer adequadamente suas experiências presentes e expressá-las abertamente. O cliente começa a desenvolver a autoconsideração positiva incondicional, o que significa que ele tem os sentimentos de cuidado e afeição genuínos pela pessoa que está se tornando. Também é nesse estágio que o cliente começa a sentir uma certa soltura fisiológica com maior relaxamento da musculatura, melhor circulação sanguínea e maior facilidade em vivenciar emoções. Os sintomas físicos desagradáveis que o paciente apresentava antes da terapia desaparecem.

Normalmente, o estágio 6 indica o final da psicoterapia.

Estágio 7: Após o estágio 6, o cliente chegará ao estágio 7 com ou sem acompanhamento do terapeuta, pois o crescimento instalado no estágio 6 é irreversível. Assim, o indivíduo chega ao estágio 7 como uma pessoa completamente funcional, tornando-se capaz de generalizar os benefícios obtidos com a terapia para toda a sua vida fora da terapia. Assim, ele passa a ter confiança para ser ele mesmo todo o tempo, de apropriar-se e sentir em profundidade todas as suas experiências, vivenciando-as no presente. Seu eu real, agora unificado ao autoconceito, torna-se o ponto de partida de avaliação das suas experiências, e o indivíduo sente prazer ao perceber que essas avaliações internas fluem com tranquilidade, e que a mudança e o crescimento continuarão. A pessoa torna-se congruente, possui autoconsideração positiva incondicional e é capaz de ser amável e empática com outras pessoas.

setePor se tornar mais realista, o indivíduo passa a ter uma visão mais adequada das suas potencialidades, o que permite que a distância entre o eu real (a pessoa que se é) e o eu ideal (a pessoa que se deseja ser) diminua. Essa distância diminui porque tanto o eu real quanto o eu ideal se alteram, ou seja, o eu ideal torna-se menos idealizado, a pessoa percebe que pode diminuir as expetativas em relação ao que ela desejaria ou “deveria” ser; simultaneamente, a autoconsideração positiva faz com que ela eleve a percepção a respeito de si mesma.

A diminuição da distância entre o eu real e o eu ideal reduz a tensão psicológica, o indivíduo torna-se menos vulnerável à ameaça e sente menos ansiedade. Ele também sente menor necessidade de procurar outras pessoas para pedir orientações e é menos provável que se valha das opiniões e valores de terceiros para avaliar as próprias experiências. Ao contrário, a pessoa se torna mais autodirigida e mais consciente de que o ponto de partida das avaliações reside dentro de si. Não há mais necessidade de agradar às outras pessoas e de atender a expectativas externas.

O relacionamento com os outros também se modifica. O indivíduo passa a aceitar mais as outras pessoas, fazendo menos exigências e permitindo que elas sejam simplesmente quem são. Como existe menor necessidade de distorção da realidade, o indivíduo tem menos desejo de forçar os outros a atenderem suas expectativas. Adicionalmente, ele passa a ser percebido pelos outros como mais maduro, mais agradável e mais sociável. Sua congruência, autoaceitação e empatia estendem-se para além da terapia, e ele se torna mais capaz de participar de outros relacionamentos facilitadores do crescimento.

 

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Obras sugeridas:

“Theories of Personality”, 7th edition, de Jess Feist e Gregory Feist.

“Theories of Personality”, 9th edition, de Richard Ryckman.

“Theories of Personality”, 9th edition, de Duane P. Schultz e Sydney Ellen Schultz.

“Teorias da Personalidade: da teoria clássica à pesquisa moderna”, de Howard Friedman e Miriam Schustack.

“Personalidade: teoria e prática” de Lawrence Pervin e Oliver John.

“Tornar-se Pessoa” de Carl Rogers.

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